A Cultura Livre precisa de Dinheiro ?
por
Leonardo Foletto*
É estranho escrever sobre mídia radical, um nome pomposo para algo que sinto não fazer parte, mas vamos lá.
Uma página como o BaixaCultura, assim como trocentas outras que se tornaram uma fonte de informação alternativa (e, vá lá, radical) à grupos jornalísticos tradicionais, não é estruturada de maneira que possa se encaixar no conceito institucionalizado de jornalismo. Para ficar em exemplos práticos: não existe complexidade na divisão de trabalho, não tem pauteiro, nem editor, nem repórter, nem uma intranet que facilite o trabalho, nem condições financeiras para se permitir ficar dias, semanas e meses apurando para a produção de uma única reportagem. Isso tudo até que não seria um problema se não houvesse um fator principal: não há dinheiro algum envolvido, nem qualquer “interface com o mercado”, o que classifica a atividade como não profissional.Tais iniciativas de produção e divulgação de informação independentes da grande mídia levam o nome de mídia radical.
E páginas como as do Baixa Cultura estão longe de ser – e na maioria das vezes de querer ser - jornalismo “profissional”.
Mas isso não significa que elas sejam “piores” por não terem uma estrutura profissional, por não envolver dinheiro e por não ter uma “interface com o mercado”. Estes milhares de páginas, blogs, fanzines, revistas, rádios-pirata e assemelhados se colocam como mais uma fonte de informação que não pretende ser neutra, imparcial, “objetiva”. Uma fonte que se aproveita do continuum de informações disponíveis na rede e no cotidiano local e soma opinião, análise e crítica para, de alguma forma, buscar uma interpretação possível da realidade – seja ela global, nacional, regional, municipal – e atender aos cidadãos em seu direito fundamental à informação.
Se não a melhor interpretação (e existe melhor?), a que cada um entende como justa e necessária para que possamos compreender esse mundão cada vez mais complexo e, quem sabe, agirmos para sua melhora. Uma utopia, diriam alguns, mas quem vive sem elas?
Talvez o mais “radical” da coisa toda é buscar manter uma publicação que, se não tem compromissos como os de uma mídia profissional que fala para milhões, tem o compromisso direto com o seu leitor de publicar textos relevantes, bem apurados e corretos na medida do possível. Fazer isso periodicamente requer tempo, às vezes (quase sempre) mais tempo do que se costuma ter. Diria que é uma questão de amor trabalhar diversas horas por semana em algo que não te sustenta mas sem o qual não se consegue viver.
Nesse sentido, o combustível que mantém estas, vá lá, “mídias radicais” (e, falando por mim, o BaixaCultura) vivas é o retorno de quem lê. Um comentário bem feito, uma crítica construtiva (ou destrutiva), um elogio sincero, uma indicação para outros lerem ou até mesmo um convite para um debate e uma conversa mais aprofundada é o nosso pagamento semanal. Significa que, para alguns, que nunca serão os milhares e milhões de uma empresa jornalística profissional porque estamos falando de uma mídia essencialmente de nicho, aquele texto serviu para entender um tantinho mais da complexidade desse mundo, municiando quem lê com informações importantes para a manutenção de uma postura ativa e autônoma perante a sociedade.
Fazer parte de uma mídia radical, seja na web ou fora dela, talvez seja como fazer um “jornalismo sem fins lucrativos”. Um jornalismo que busca compreender a realidade a partir de um viés personalíssimo e que sobrevive através da possibilidade de propagação de suas “interpretações” da(s) realidade(s). Se elas se espalharem e conseguirem fazer com que cada um que leia/escute/veja tome suas decisões por si, mais independente do mundo externo, está dado o nosso lucro e cumprida nossa missão.
Como se vê, é tarefa para utópicos. Mas, como já disse aqui, e quem vive sem sonhos e utopias a estofar nossa aparente racionalidade pragmática?
* Leonardo Foletto é jornalista, mestre em jornalismo pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), com dissertação sobre blogs jornalísticos. É um dos editores do http://baixacultura.org e, como deu pra ver nesse texto, um utópico de carteirinha.
Twitter: @leofoletto
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