sábado, 19 de junho de 2010

Tempos Modernos - O Jornalista e a Internet



por
Gilmar R. Silva*

Em setembro de 2009 um dos mais prestigiados jornais do mundo, o norte-americano New York Times, publicou uma nota na internet, na qual informava que, a partir de então, passaria a se identificar como uma empresa de informação, não mais um jornal impresso. A nota causou furor em redações de todo o planeta, pois, enquanto outros tradicionais jornais da terra do Tio Sam vem falindo ano após ano, agarrados à arcaicos modelos comerciais, o jornalão mais famoso seguiu o espírito de vanguarda que lhe deu fama e lançou-se a procura do leitor perdido. A questão é, em que diabos de lugar se esconderam os leitores?. A resposta para muitos especialistas é categórica, o leitor está na internet. E é para esta que o NYT concentra sua munição agora.

Quer dizer então que o povo da internet lê? Respondo, não só lê, como vê fotos, assiste à videos, paga contas, faz compras, vota no próximo eliminado do big brother e faz fofoca.Tudo isso as vezes no meio tempo de um download de música.
A palavra chave é multimídia, mas não é só o meio( o computador) que carrega essa pecha, seus usuários também. As pessoas postam fotos, vídeos, recados, mantém um blog, fazem debates, propaganda, desenham, jogam, conversam, se olham. As vezes sem precisar sair de uma única tela, como acontece no site de relacionamentos Facebook.

O internauta também produz conteúdo, essa é a chamada web 2.0, e não precisa ser nenhum especialista para isso. Os internautas criticam jornalistas, descem a lenha em matérias, idolatram novos ídolos, conhecem discos e filmes sem sequer ter que abrir um jornal ou revista. Os jornalões norte-americanos que faliram, se incomodavam com isso, julgavam-se os detentores da informação, quando na verdade esta última é livre. E se existe uma idéia digna de propaganda nestes tempos de internet é essa, a informação é de todos. Desde que, claro, estes tenham acesso a um computador.

Mas e os jornalistas e jornais que não se assustam com esta posição horizontal do leitor o que tem feito para agradá-lo? Como agradar a uma massa cada vez mais disforme?
Chris Anderson, pesquisador e editor da revista Wired, em sua teoria da cauda longa defende que sobreviverão os que atenderem a nichos específicos da sociedade. O New York Times tem seguido essa linha, os internautas que visitam o site podem optar por comprar os cadernos do jornal separados, por exemplo, um torcedor do Chicago Bulls pode comprar o caderno de esportes com o balanço da rodada da NBA sem ter que levar os cadernos de economia, política, cultura e cidades juntos.Não bastasse, este ainda pode se inscrever e personalizar sua própria página no site de uma maneira que esta só traga matérias de seu interesse.

Jornal com a cara do leitor, porque a capa como a conhecemos, na internet não tem sentido.O pesquisador Richard Gingras é o nome por trás dessa máxima e dá a dica, pra ele o leitor quando busca na internet uma matéria sobre um escândalo qualquer, quer mais, quer o que oferece por exemplo a Wikipedia , um recorte substancial, de preferência com links que o levem a perfis e histórico de todos envolvidos.Para após isso não só tirar suas conclusões como opinar, seja no seu próprio blog ou no blog do jornal.

E é neste ponto que entra a figura do novo jornalista, o jornalista em tempos de internet. As características desse profissional não difere da essência do bom jornalista das antigas.Ética, curiosidade e saber ouvir versões distintas de um mesmo fato continuam dando a tônica da profissão. Mas, o novo jornalista deve ter na cabeça uma coisa, não basta só escrever, fotografar, pesquisar,entrevistar, diagramar ou filmar.Ele precisa dominar todas estas técnicas juntas, porque o seu leitor na internet domina e vai cobrar. Web 2.0 lembra?Já era a figura do leitor passivo. O novo jornalista deve saber que o seu texto na internet não termina no ponto final, ele se desdobra na caixa de comentários.E nesta surgem discussões entre jornalista x leitor, leitor x leitor, que levantam novas pautas para o primeiro trabalhar. O leitor não da pitaco, colabora.

O leitor colabora? Isso mesmo, menosprezar a inteligência do leitor em tempos de internet é atestar a própria burrice. Exemplos recentes de empreendedorismo jornalístico, na rede, não carregam a assinatura de um grande jornalista ou de um grande grupo de comunicação.Sites como o Oh My News da Coréia do Sul, Overmundo do Brasil, e o Pirate Bureau da Suécia, tem em comum que foram construídos de maneira colaborativa.O primeiro reúne jornalistas e não jornalistas, freelancers e desempregados, que em tempos de crise se juntaram e hoje detêm o site informativo mais influente da Coréia do Sul.O exemplo brasileiro age na mesma linha, as pessoas colaboram entre si, uns enviam textos, uns diagramam, outros tiram fotos, cuidam da tecnologia de informação, da edição dos posts. As pessoas, mais uma vez jornalistas e não jornalistas tocam o barco.E já que falamos de barco eis o Pirate Bureau, um grupo de amigos suecos que no inicio dos anos 2000 se juntou a fim de defender a bandeira da cultura livre.O grupo hoje conta com o site Pirate Bay, um dos sites mais acessados do mundo, e deu origem ao Partido Político Pirate, que elegeu, no último pleito sueco, um deputado que defende a causa da cultura e informação livre.

Ta bom e estes sites sobrevivem do que? Pergunta o leitor com as sobrancelhas de prontidão. A resposta é, daquilo que banca o jornalismo desde os primórdios do último século, a publicidade.
Mas pra isso é preciso alguém pra gerenciar, alfineta, com toda a razão ,o mesmo leitor das sobrancelhas levantadas. Isso porque o fato do site, jornal, ou revista eletrônica surgir de maneira colaborativa não implica que ele não tenha cabeças que o idealizaram, e que queiram levá-lo a outros patamares. E quanto mais visitado, mais atrativo para o mercado publicitário se torna o site em questão.

É preciso ter em mente que a informação é livre, mas o trabalho para se apurar bem uma matéria custa dinheiro, assim como manter um site no ar. Cabe aqui o comentário do jornalista Pedro Dória do jornal o Estado de S. Paulo, “Quem apostar contra os grandes veículos vai perder”. Grandes grupos como Abril, Uol e Globo, detêm capital, tanto para investir em novas apostas, de modelos jornalísticos, como para melar iniciativas. Cabe ao jornalista empreendedor escolher, quando bem sucedido, manter-se alternativo, atendendo a um único nicho, ou lançar-se no desafio da multidão disforme, sendo cooptado por uma Globo ou Abril. A última opção traz um número maior de verdinhas como recompensa.

O New York Times citado no início do ensaio tem levado esse estilo de cooptação a sério, na sua página na internet abriga blogueiros famosos, que ganham salários de estrelas e mesmo que falem para nichos específicos, estes tem a visibilidade de um veículo centenário, a marca de um grande grupo faz a diferença, o que acaba satisfazendo-os. O jornalista assim como o escritor quer, sobretudo, ser lido. O jornalista em tempos de internet quer a caixa de comentários cheia. Não bastasse, me parece ser da profissão, esta além do lado egocêntrico, apresenta um lado sadomasoquista, o jornalista em tempos de Internet. me parece estar sempre a espera de um rival na caixa de comentários, que o desafie para um duelo, insultando-o pelo comentário do último post.

Porque o leitor , sim, ainda lê. Uns lêem só imagens, fotos, vídeos, o que não é ruim, porque estas também são tipos de leitura.E existem os que lêem só 140 caracteres, só o lead, só a capa do site, mas calma, também existem os que lêem análises de política internacional, resenhas literárias e mesmo grandes reportagens na tela do computador.

O Jornalismo está passando por transformações, saindo de uma zona de conforto secular, e o grande barato é que não da pra apontar os coreanos do Oh My News e dizer que eles estão no caminho certo, ou então, dizer que o New York Times está dando uma lição de como se reinventar. Isso porque todo o jornalismo está se reinventando, seja ele de rádio, TV, impresso ou internet. Certo é que uma pluralidade de formatos e questões tem sido debatidas. E em todas elas me parece haver um consenso, a informação é livre, mas continua tão valiosa quanto nunca. Ganha o leitor.


*Gilmar R. Silva é educador e jornalista entusiasta da cultura pop, da cultura digital e da cultura DIY. Atualmente trabalha como Analista Multimídia do SESC São José dos Campos

Um comentário:

  1. A figura do jornalista 2.0 ainda parece confusa. Se até então existia (e ainda existe) o jornalista especializado, que potencializa seu conhecimento para determinado assunto (e recebe investimento de sua empresa neste sentido)hoje este profissional se fragmentou, tal como o meio em que precisa trabalhar.

    Esta fragmentação, tão bem-vinda para determinados contextos já rende frutos um tanto duvidosos, como o Twitter (aclamado como o salvador dos blogs, por ser menos prolixo, mas que para mim fede mais do que cheira).

    Ainda tentando contextualizar, como fica a luta pela regulamentação do profissional de comunicação (vide tentativa de criar o Conselho de Jornalismo e a obrigatoriedade do diploma) no mar aberto e "grátis" que a internet instaura?

    Em suma, os "novos jornalistas" têm muito em que pensar. Estou acompanhando o nascimento do blog, parabéns pela iniciativa.

    > Sugestão: divide o texto em blocos, fica mais fácil para ler. Ah, e cuidado com o português.

    Eduardo
    akamarinho.wordpress

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