domingo, 27 de junho de 2010

Comunicação em todos os sentidos


por
Heitor Botan*


"O cliente pode ter o carro da cor que quiser, contanto que seja preto"


A frase é de Henry Ford. A justificativa era de que a produção de carros unicamente pretos era significativa para a alta produtividade da linha de produção da Ford, no começo do século XX. E o contexto perpetuou-se por muitos anos na relação entre empresa e cliente.


Por décadas, o consumidor sempre teve pouca participação na comunicação com as empresas ou instituições do setor público. As mensagens sempre circulavam em uma via de mão única: de um lado, organizações "despejando" informações. Do outro, o público recebendo estes dados, até mesmo aqueles que não o interessava. E a recíproca não era verdadeira.

Nos seus projetos de comunicação com clientes e colaboradores, as empresas se apoiavam nos pilares da mídia tradicional, instituída a produzir conteúdo que provocasse pouca - ou nenhuma interatividade. Por quantos anos redigimos nossas matérias seguindo o conceito da pirâmide invertida? Ou seja: determinávamos ao leitor até o modo como ele iria conduzir a própria leitura e o ponto em que os fatos deixavam de ser imprescindíveis para a compreensão do texto.


O mesmo vale para os veículos eletrônicos: editores escolhem como as reportagens serão apresentadas ao longo de um programa, e essa ordem terá que ser seguida pelo leitor. Caso esse queira se rebelar, pouco poderá fazer. Desligar o aparelho ou mudar de canal são suas opções.

Nesse monólogo construído pela mídia, que as empresas adotaram para seus projetos de comunicação, a organização fala para uma "plateia", que pouco pode fazer para interagir com as mensagens direcionadas para si própria. Que essa é uma posição confortável para as empresas, não se pode negar. Afinal, por muitos anos elas tiveram como princípio investir esforços naquilo que dá retorno financeiro (produção, processos administrativos), em detrimento da comunicação com o cliente.

A internet não funciona assim. Nas palavras do professor J. B. Pinho, no livro Relações Públicas na internet, o público tem latente a expectativa de participar, de interagir. E o conteúdo on-line que ofereça um padrão mínimo de interação tem pouco valor para o usuário. A internet transformou o monólogo em um diálogo. Uma conversa aberta e disponível a todos aqueles que queiram participar.

E essa transformação da comunicação ocorreu simultâneamente a uma sequência de transformações sociais. As pessoas não se acomodam mais à situação de plateia, e seguem para a conversa, mesmo que elas próprias tenham que "puxar o assunto". A sociedade não espera mais que a empresa se manifeste, para só depois poder demonstrar sua opinião. No Brasil, esta situação ficou clara, principalmente, após a maturidade do Código de Defesa do Consumidor.

As empresas, então, tiveram que se adaptar a este novo perfil de comunicação, em que um "um para todos" deu lugar ao "todos para todos". E este processo não foi fácil. Afinal, deixar a posição de emissor único para se colocar na situação de um emissor e receptor, ao mesmo tempo, demandou uma revisão de conceitos, valores e ideais.

Neste processo, os profissionais de comunicação, alinhados e atualizados quanto a todas as transformações sociais e midiáticas que ocorriam, foram fundamentais para conduzir organizações de um plano unidirecional a um plano bidirecional de comunicação. Foram os profissionais de comunicação que tiraram as empresas da pista de mão única para levá-las às pistas com quantas vias forem necessárias para atender a expectativa dos clientes.

Assim, surgiram os blogs corporativos: ferramentas que permitem a comunicação direta, bidirecional e com resposta instantânea, segundo definição da Carol Terra. Os blogs corporativos permitem que clientes e empresas participem da mesma conversa, podendo esclarecer dúvidas, antecipar lançamentos para se obter avaliações, reforçar valores da organização e posicionar sua marca junto ao público de interesse.

Além disso, o usuário da internet privilegia decisões de empresas que buscam estabelecer essa relação bidirecional na mídia digital. Basta ver o exemplo da Petrobrás, que com o site Fatos & Dados conseguiu, no início, gerar polêmica com a imprensa, mas conquistar seguidores que apoiavam o fim da intermediação entre organizações públicas e jornalistas para gerar o conteúdo levado aos leitores.

Para se obter sucesso com blogs corporativos, os conceitos da comunicação bidirecional devem estar claros em toda e qualquer comunicação com clientes, seja esta começada pela empresa ou pelo público. Por isso, todo blog corporativo deve ter caráter autoral, identificando quem é que escreve, de quem é essa opinião, além de ter resposta rápida aos questionamentos (não adianta demorar para responder aquilo que um cliente postou) e permitir ao máximo a participação e colaboração do público.

Atualmente, partir para o diálogo junto ao internauta, por meio de redes sociais, blogs e fóruns, já é um caminho sem volta. Independente de sua empresa querer ou não estar na web ou nas redes sociais digitais, o usuário comum irá te colocar de alguma forma, seja para enaltecer o seu produto, ou para criticá-lo. Mais comum do que as comunidades "eu amo a marca X", são as manifestações "eu odeio a marca X". Não desperte a ira do cliente na internet. É melhor deixar claro que ele pode ter o produto na cor que ele quiser.


*Heitor Botan é jornalista, representante de comunicação do SENAC Taubaté e owner do
Focas em AI .

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